quinta-feira, 22 de março de 2018

ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS (2010)

NOTA 7,0

Tim Burton praticamente
reinventa conto clássico, mas
deixa que os apelos visuais da
produção sobressaiam ao enredo
Cineastas que evitam atirar para todos os lados experimentando vários gêneros conseguem criar uma marca própria e fidelizar seu público, sendo o maior exemplo disso Woody Allen com suas histórias que mesclam drama e humor e sempre contam com um elenco numeroso e estrelar. Porém, outros conseguem transitar por diversos campos e ainda assim deixar sua assinatura na obra, como é o caso de Tim Burton, um habilidoso mestre na arte de criar imagens criativas graças ao apuro técnico que emprega em seus trabalhos, mas jamais se esquecendo de construir personagens e histórias memoráveis. Com plateias cativas, cada novo lançamento seu é um verdadeiro evento que marca época e depois ultrapassa gerações. Alice no País das Maravilhas tem potencial para tanto, embora o impacto esperado no lançamento não tenha ocorrido. Para muitos, desta vez o diretor não equilibrou bem a qualidade visual com a do enredo. A tão aguardada união do clássico surreal infantil com o estilo excêntrico do diretor prometia bem mais e ainda divide opiniões. Para quem espera uma transposição literal do famoso desenho animado da década de 1950 para uma versão com atores de verdade, até porque a produção do longa é da própria Disney, pode se decepcionar ou talvez se entusiasmar com as novidades. Todas as histórias clássicas que já ganharam suas versões em animação criam a ilusão de que são as transposições fiéis dos contos, mas aqui o tal país maravilhoso é bem diferente e mais próximo do livro original segundo relatos. Burton inseriu e modificou situações e personagens, cercou-se de bons atores e amigos, caprichou no visual e em efeitos para atender a demanda desenfreada do 3D, porém, esqueceu de envolver o público em sua visão do conto de Lewis Carroll publicado originalmente em 1865. A história começa apresentando a jovem Alice (Mia Wasikowska) em meio a sua festa de noivado onde se depara com um coelho branco. O detalhe é que ele usa roupas, está apressado e sempre olhando no relógio. Ela o segue e entra em um buraco que a leva ao País das Maravilhas, um local onde esteve há alguns anos apesar de nada se lembrar. Lá ela é recepcionada por estranhas criaturas como uma lagarta e um gato falante e pelo Chapeleiro Louco (Johnny Depp), além de conhecer em suas andanças outros seres fantásticos e mágicos. Mas nem tudo são flores nesse local. Ela descobre que não está lá por acaso e irá enfrentar a ira da cruel Rainha Vermelha (Helena Bonham Carter) para ajudar a Rainha Branca (Anne Hathaway) que foi traída pela própria irmã que almejava o poder absoluto do local.

Burton gosta de criar suas próprias bizarrices, mas não dispensa as chances de poder dar seu toque pessoal a obras famosas do cinema. Ele reinventou, por exemplo, Planeta dos Macacos e A Fantástica Fábrica de Chocolate e obviamente não escapou de críticas negativas em nenhuma dessas ocasiões e tampouco quando se aventurou a recontar a história de Alice e seu mundo de fantasia. Era de se esperar. O público se acostuma com a versão clássica e rejeita qualquer inovação. Os burburinhos só não foram maiores porque o diretor tem seus seguidores fiéis que aprovam tudo que ele faz. Somam-se a eles a legião gigantesca de fãs de Depp, afinal querendo ou não ele é um tremendo chamariz e seu personagem foi praticamente elevado a categoria de protagonista. Ele deu certo ar melancólico à sua criação que nos faz esquecer o personagem homônimo e irritante do desenho Disney, todavia, esse efeito talvez não tenha sido proposital, mas sim uma imposição para aplicações de efeitos especiais. Mas o que chama a atenção mesmo são as duas nobres do conto. A Rainha de Copas, ou melhor, a Rainha Vermelha como é chamada, é muito curiosa. Com o auxílio da computação, Helena, a esposa do cineasta, aparece como uma criação virtual, assim como outros personagens como a Lebre Maluca. Já a Rainha Branca é uma personagem tão apagadinha quanto seu nome e colabora para tanto o fato de ela não fazer parte da maioria das versões do conto, sejam elas de cinema, livros, teatrais ou de TV. Ainda que conte com um leque repleto de personagens de bizarros a serem explorados, Burton praticamente limou a pegada surreal do texto original, assim não espere viradas inesperadas ou malucas de tempos em tempos e sim um enredo que parece a todo custo tentar dar alguma lógica a trajetória de Alice por um mundo paralelo encontrado no subterrâneo. Mas nem tudo é ruim nesta história. Não deixa de ser curiosa a introdução e a conclusão, as mudanças comportamentais de certos personagens e até as explicações para o porquê de cada um deles ser de um jeito ou de outro, como a vilã que é solitária e sofre com sua condição física diferenciada, frustrações que ela descarrega em seus planos malévolos.

Como já era esperado o visual é o melhor deste trabalho, utilizando em boa parte das cenas a tecnologia que captura a imagem dos atores e depois as mesmas são reconstituídas na pós-produção com recursos de animação, a mesma técnica de A Lenda de Beowulf. Vale elogios, mas também ressalvas. Fica claro que todos os elementos de cena e dos aspectos físicos dos personagens foram minuciosamente pensados e acabam transformando a imagem que qualquer um tinha do conto da Alice. O empenho resultou no Oscar de direção de arte e também de figurinos, embora ambos os departamentos tenham recebido uma mãozinha da tecnologia, desde uma simples árvore até a já citada Rainha Vermelha que possui uma cabeça desproporcional ao seu corpo achatado.  O ápice do uso de computadores para fazer as animações é nos momentos finais quando há uma batalha épica que destoa um pouco no conjunto.  Porém, o que pode ser o grande destaque desta produção também pode ser o que a atrapalhe. A preocupação com efeitos especiais, cores e afins parece não ter se repetido na concepção da história. Infelizmente, a adaptação feita por Linda Woolverton do clássico conto não empolga, foge da premissa e em meio a tantos elementos para deleite dos olhos o espectador passa quase que exclusivamente a acompanhar a trama visualmente e pouco pela audição. A história conhecida e previsível acaba encontrando elementos para fisgar a atenção do público quadro a quadro, o que mostra que a obra tem seu valor, mas isso não é o suficiente para ser considerada um marco da história do cinema. Alice no País das Maravilhas continua com sua aura onírica e capaz de fazer o público sonhar com um mundo fantástico onde tudo é possível, mas a versão de Burton perde pontos ao conquistar uma imagem de entretenimento feito exclusivamente para obter lucros. Visando as platéias que se encantaram pelo 3D, Burton tentou corresponder as exigências do mercado cinematográfico atual preservando ainda as características que marcaram sua filmografia, mas conseguiu um resultado que pode ser classificado apenas como um pouco acima do patamar regular. Simplesmente é mais uma prova de que tecnologia não é tudo. O cinema para sobreviver precisa de boas histórias. Uma pena que quem dita as regras no mundo do cinema (estúdios, produtoras, investidores, exibidores e afins) estão cegos por causa de um ou outro resultado financeiro obtido através do marketing da tridimensionalidade, porém, a realidade é bem diferente.

Vencedor do Oscar de direção de arte e figurino

Aventura - 109 min - 2010 

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Um comentário:

Rafael W. disse...

Não é um dos melhores do Burton, mas diverte, além do visual espetacular. Helena Bonham Carter rouba a cena.

http://cinelupinha.blogspot.com/