sexta-feira, 31 de julho de 2015

HAIRSPRAY - EM BUSCA DA FAMA

NOTA 9,0

Refilmagem de cult movie dos
anos 80 privilegia o estilo
musical a la Broadway para
falar sobre preconceitos e sonhos
Entre algumas das surpresas que a sétima arte tem nos proporcionado neste início de século 21 podemos destacar a volta em grande estilo dos musicais. Originais, refilmagens, de estilos clássicos ou moderninhos. Tem opções para todos os gostos. As produções da Broadway obviamente tornaram-se uma grande fonte de inspiração e alguns trabalhos curiosamente antes de chegarem aos palcos já tinham passado pelos cinemas. É uma relação muito amistosa que existe entre estas duas manifestações artísticas e sempre há a possibilidade de se melhorar aquilo que já era bom a cada nova adaptação como é o caso do filme Hairspray – Em Busca da Fama, um musical com um elenco espetacular, mas, como todos os títulos do gênero, divide opiniões. Milhões de pessoas se renderam às gargalhadas e acabaram dançando ao som da animada trilha sonora. Na mesma proporção, há quem critique, se irrite com tanta cantoria e não veja o menor fundamento para tal obra existir. É preciso deixar a alegria falar mais alto para poder aproveitar este filme cujas duas horas passam voando visto a quantidade de situações e personagens que o roteiro oferece. O diretor Adam Shankman fez a adaptação para o cinema do famoso musical da Broadway, que inclusive já teve a sua versão brasileira, mas esta deliciosa história já teve outra versão cinematográfica. O excêntrico cineasta John Waters baseou-se em suas memórias de infância para criar um de seus trabalhos mais famosos e mais próximo do estilo comercial, Hairspray - E Éramos Todos Jovens. O longa se tornou um cult movie instantâneo e foi sucesso de crítica e público. Tanto o filme dos anos 80 quanto o mais recente são exagerados e coloridos, mas o antigo fica em desvantagem em alguns pontos em relação a sua reinvenção. Envelheceu bastante e o visual kitsch pode incomodar, além de que não era assumidamente um musical. De qualquer forma, ambos são divertidos, marcaram época e ainda continuam colecionando fãs. Em 2002, o texto de Waters foi reformulado para ocupar os palcos e finalmente ganhou status de musical e foi nesta fonte que Shankman bebeu e construiu um delicioso show que diverte e ainda toca em uma ferida aberta há centenas de anos, mas que até hoje não cicatrizou totalmente: o preconceito. Tudo aqui parece tão cheio de vida justamente porque Waters pessoalmente levou o diretor a conhecer a cidade de Baltimore, o local onde as ações do longa acontecem, e passou a ele informações valiosas sobre o passado do local e como se comportava a sociedade da década de 1960. Shankman que até então tinha projetos modestos no currículo, como Operação Babá e Doze é Demais, teve finalmente em suas mãos um verdadeiro tesouro que soube cuidar muito bem e que atraiu um elenco sensacional, incluindo os coadjuvantes.

Na realidade a maneira como o roteiro de Leslie Dixon (baseado no texto original de Waters e Thomas Meeham que também colaboraram na readaptação) conduz a narrativa acaba elegendo protagonistas apenas por convenção, mas este é um dos poucos casos em que um elenco inflado tem a chance de brilhar de forma praticamente homogênea. Todos têm seu momento de aparecer, inclusive para soltar a voz e arriscar alguns passos de dança. Logo no início, somos convidados a conhecer o mundo em que vive Tracy Turnblad (Nikki Blonski), uma jovem aspirante a dançarina. Estamos nos efervescentes anos 60 e o sonho de todo adolescente da cidade de Baltimore é aparecer no programa de dança do Corny Collins (James Marsden). Tracy sonha em conquistar uma vaga fixa no programa mesmo contra a vontade de sua mãe, Edna (Travolta), que sabe que o mundo é preconceituoso e que sua filha por ser acima do peso poderia sofrer decepções e ser maltratada. Ainda assim, a garota vai com muita coragem fazer um teste, mas terá que passar pelos olhos de lince da mau caráter Velma von Tussle (Michelle Pfeiffer), a diretora do show. Ela odeia aqueles a quem considera diferente, ou seja, fora dos padrões de beleza dos caucasianos puros, e até inventou a contragosto o "Dia do Negro", uma data especial para que as pessoas negras pudessem dançar na TV. Reprovada no teste, Tracy consegue uma segunda chance ao esbarrar no colégio em Link Larkin (Zac Efron), um dos dançarinos da atração e por quem ela é apaixonada. O rapaz a convida para um novo teste e desta vez o próprio Collins se impressiona com o gingado da gordinha e aceita ela no elenco de seu programa. Não demora muito e Tracy se torna um grande sucesso, ameaçando o reinado de Amber (Brittany Snow), a filha de Velma e também participante do programa. As duas, além de disputarem o amor de Link, também passam a duelar pela coroa do concurso Miss Hairspray. Assim, Tracy descobre o preconceito existente no mundo dos famosos e passa a ser vítima das armações da invejosa dupla de mãe e filha. Porém, ela decide usar sua fama para lutar contra todas as formas de preconceito e não está sozinha para vencer as dificuldades e conta com a ajuda de grandes amigos, como Maybelle (Queen Latifah), Penny (Amanda Bynes) e de seu pai, Wilbur (Christopher Walken). Até sua mãe acaba superando os próprios limites que ela mesma se impôs devido a sua avantajada forma física e acaba descobrindo que as coisas mudaram e que todos têm direito de lutar por seu espaço na sociedade revolucionária sessentista.

Apesar do aspecto de comédia bobinha, o roteiro é inteligente e mostra de forma leve, mas em alto e bom som, o quanto o preconceito está impregnado nas culturas segregando as raças e as pessoas consideradas diferentes, seja por sua cor, origem ou aparência física. O embate entre as personagens Maybelle e Velma ressalta o tema que fica ainda mais gritante com as imposições feitas aos negros para que possam aparecer na televisão. Embora as duas tenham personagens fortes e apareçam bastante em cena, é claro que as atenções caem sobre Travolta, recuperando o fôlego de sua carreira e mantendo a tradição de um homem viver uma rotunda matriarca tal qual ocorreu na primeira versão de cinema e na teatral, e em cima da então novata Nikki Blonsk que até então era atendente em uma sorveteria. A garota esbanja entusiasmo com sua cativante personagem que deseja promover a integração entre todos. Também merecem destaque as atuações de Marsden, Efron, Brittany e de Elijah Kelly, o amigo “excluído” (mas no seu núcleo de amizades quase um ídolo) que encoraja ainda mais a protagonista a lutar pelos seus ideias. Apesar do preconceito com os negros e os gordinhos serem os temas que saltam aos olhos, praticamente todos os personagens tem algum motivo para se entristecer. Collins empresta seu nome para intitular um programa de TV, mas não tem domínio algum sobre ele. Penny é reprimida pela mãe, uma fanática religiosa. Amber faz de tudo para aparecer na mídia, mas talvez toda sua pose seja para agradar a mãe. O que fica evidente é que todos eles não sofrem apenas por ações dos outros, mas eles próprios se impõem limites para não baterem de frente com aqueles que o coagem. Assim, o último número musical é como se fosse o grito de liberdade de todos eles. Com uma edição rápida, interpretações divertidas e inspiradas, canções divertidas e contagiantes, cenografia e figurinos propositalmente exagerados e um texto inteligente, curiosamente esta produção muito elogiada pela crítica e espectadores não chegou a receber nenhuma indicação para o Oscar, uma grade injustiça feita a um musical repleto de qualidades. Atuar já é difícil. Cantar e dançar nem se fala. O elenco nota mil deixa transparecer entusiasmo a cada nova cena e, acompanhados do visual colorido e do ritmo das músicas, fazem um convite ao público para participarem de um verdadeiro espetáculo em todos os sentidos. Esqueça o pé atrás com os musicais (olha o preconceito!) e mesmo que já tenha visto o filme antigo, não deixe de assistir esta refilmagem, ou melhor, esta reinvenção que simplesmente transformou em ótimo o que já era bom. Hairspray – Em Busca da Fama já nasceu com aquela aura de clássico estilo sessão da tarde, diverte a todas as idades e ainda de quebra ajuda a introduzir às crianças a discussão sobre o preconceito de forma leve e sobre como é importante nunca desistir dos sonhos e jamais se sentir diminuído. Lições para toda a vida servidas com bom humor e alto astral. Vale a pena.

Musical - 116 min - 2007 

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