terça-feira, 11 de agosto de 2015

REENCONTRANDO A FELICIDADE

NOTA 8,0

Como lidar com a dor da
perda de uma pessoa
querida? Drama mostra que
as reações podem surpreender
A morte é um episódio doloroso da vida com o qual todos precisam aprender a lidar, mas isso não é nada fácil, principalmente quando se perde um ente querido. Pela ordem natural das coisas, as pessoas mais velhas partem antes das mais novas, mas como lidar com a situação de perda quando há uma inversão como, por exemplo, o filho falecer antes dos pais? É justamente a respeito desta dor que gira o enredo de Reencontrando a Felicidade, um eficiente drama dirigido por John Cameron Mitchell, responsável pelos polêmicos Hedwig – Rock, Amor e Traição e Shortbus. Em seu terceiro trabalho atrás das câmeras, o cineasta deixou que o seu momento de vida o inspirasse. Após perder um irmão de apenas dez anos de idade, Mitchell adquiriu toda a carga dramática necessária para expor a dor da perda em um longa-metragem e provar que como diz o ditado o tempo é o melhor remédio para esse tipo de caso. A atriz Nicole Kidman pela primeira vez atua e ainda acumula a função de produtora de um filme. O roteiro de David Lindsay-Abaire é baseado em sua própria peça apresentada com sucesso na Broadway e enfoca o casal Becca (Nicole) e Howie Corbett (Aaron Eckhart) que teve suas vidas profundamente abaladas por uma fatalidade. Danny (Phoenix List), o filho deles, morreu em um acidente de carro ainda criança e a dor da perda abala as estruturas do relacionamento de seus pais que passam a viver em uma constante montanha-russa de emoções que já dura oito meses e compromete o relacionamento deles com eles próprios e com a sociedade. A mãe tenta viver o presente cercando-se de pessoas que possam ajudá-la a superar a situação enquanto o pai busca no passado e encontros amorosos de apenas algumas horas o apoio necessário que sua esposa não oferece, como se essas saídas fossem uma válvula de escape para a dura realidade. Já Becca chega ao ponto de iniciar uma amizade com o jovem Jason (Miles Teller), o responsável pelo acidente que matou seu filho, na esperança de levar sua vida adiante perdoando aquele que causou um mal sem intenções. 

De qualquer forma, esses pais tentam buscar um futuro positivo para suas vidas, mas nem mesmo a terapia em grupo com outros casais passando por problemas semelhantes parece apontar caminhos fáceis para os Corbett seguirem em frente. A dor só é amenizada, jamais superada. Este drama evidentemente é denso, carregado de tristeza e não é só nos diálogos que encontramos conteúdo. Aqui os gestos, olhares e o silêncio são de suma importância para compor a narrativa. Não é difícil para o espectador submergir a este drama. Apesar de algumas cenas ou a trilha sonora claramente serem usadas para manipular emoções, é no embate verbal e físico entre os protagonistas ou nas suas oposições que se encontra a força do filme que deseja mostrar como cada pessoa reage a um fato doloroso e inesperado, no caso a mãe de forma mais agressiva enquanto o pai trata o assunto de modo mais sereno. Sem se tocarem e mal se falarem, Becca e Howie travam bons diálogos com terceiros, personagens interpretados com vigor, por exemplo, por Dianne Wiest, com uma excepcional e reveladora sequência ao lado de Nicole, e Sandra Oh, mas o silêncio e a lentidão da narrativa são as grandes marcas deste trabalho e necessário à história, assim como os momentos aparentemente simplórios. Nicole e Eckhart certamente tiveram um desgaste emocional e tanto para defenderem seus personagens, mas a sintonia entre eles é perfeita, ou melhor, é perceptível que o relacionamento entre eles fora das câmeras foi amistoso, pois só assim poderiam passar a real dimensão do distanciamento existente entre Becca e Howie. O título original, “Rabbit Hole”, é uma referência clara ao conto “Alice no País das Maravilhas” no qual um coelho entra apressadamente em um buraco e desperta a curiosidade de uma garota que o segue e então toma contato com um mundo desconhecido. A metáfora no filme de Mitchell se deve ao fato de que os protagonistas também caem inesperadamente em um buraco imaginário após um fato doloroso e agora precisam redescobrir o mundo em que vivem ou que a partir de agora viverão.  
Apesar do enredo parecer profundo e reflexivo demais, o longa passa longe de ser um estudo sobre as consequências que traumas podem causar aos seres humanos e tampouco como a morte de um ente querido pode afetar a vida daqueles que permanecem vivos. Todavia, o fato de não ter essas pretensões não desvaloriza a obra, pelo contrário, até a torna mais aceitável e sincera. O diretor não quis fazer um drama arrebatador, mas simplesmente expor aquilo que sentiu ou aprendeu com a própria experiência que viveu pouco tempo antes de iniciar este projeto. Reencontrando a Felicidade é uma obra calcada principalmente no lado psicológico de seus protagonistas e que dispensa momentos dramáticos exagerados, o que deixa a narrativa mais verdadeira e menos manipuladora, ainda que a condução da trama siga um modo esquemático. Se tiramos alguma lição desta obra é aquela que sempre ouvimos quando há casos de morte. Embora todos sabemos que nosso destino é um só, ninguém está preparado para suportar a perda de alguém próximo sem viver um mínimo do período de luto, uma época em que sentimentos e pensamentos se confundem e que pode durar dias, meses, anos ou toda nossa existência. Como dito no início do texto, o tempo é o melhor remédio para esse tipo de dor, mas jamais traz a cura. As tarefas do dia-a-dia acabam nos trazendo de volta a realidade e podemos esquecer os acontecimentos por boa parte do tempo, mas basta um momento de ócio ou uma simples lembrança para a saudade bater. A vida é assim e não podemos fazer nada para mudar, apenas continuar vivendo da melhor maneira possível e tentar diariamente digerir a dor lembrando-se dos bons momentos que a pessoa que partiu nos deixou. Este filme é uma dica valiosa para repensarmos os laços familiares e de amizade, ainda mais hoje em dia em que a tendência é que as sociedades cada vez mais exaltem o individualismo, porém, os mais sensíveis ou que recentemente viverão situações parecidas com a do enredo podem se emocionar além da conta.
Drama - 91 min - 2010 
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9 – 10 Excelente, praticamente perfeito do início ao fim
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