sexta-feira, 18 de março de 2016

CARROS 2

NOTA 6,5

Continuação de animação de
sucesso é agradável apesar de
alguns problemas, mas espera-se
mais de um produto Pixar 
A Pixar tem o poder do toque de Midas. Tudo que coloca a mão vira ouro afinal já virou sinônimo de qualidade e criatividade, assim seu público e lucros altos estarão sempre garantidos a cada novo lançamento. Bem, rendimentos consideráveis certamente ela consegue tanto nos cinemas quanto com a venda de DVDs e outras mídias, além é claro do faturamento oriundo de produtos licenciados para explorarem seus personagens, mas é bom não descuidar para não sofrer uma colisão com as críticas. Demorou bastante, mas a produtora não escapou de viver seu inferno astral. Após mais de dez filmes bem sucedidos junto ao público e colhendo elogios e prêmios, foi justamente com um produto que teoricamente já teria vencido todos os desafios possíveis ainda com o trabalho em pré-produção que a empresa derrapou. Com Carros 2, continuação do sucesso de 2006, pela primeira vez o estúdio levou uns puxões de orelha por parte da crítica especializada e até mesmo do próprio público. Claro que é impossível nunca haver um escorregão na vida de uma produtora e a vez do aclamado estúdio de animação computadorizada chegou. Na época a Disney e a Pixar se uniram de forma definitiva tanto para distribuição quanto para a produção de animações, portanto, esperava-se mais desta continuação do grande sucesso que conquistou crianças e adultos. Obviamente não é um filme péssimo, longe disso, mas em comparação aos outros títulos da companhia, inclusive o próprio original deste, deixa muito a desejar. Essa é a opinião que praticamente domina os comentários de sites, blogs, jornais e revistas, mas estes textos com enfoques comparativos acabaram prejudicando uma obra que não merecia tanto achincalhe. O problema principal é que o roteiro não parece tão atrativo e de fácil assimilação quanto o da primeira aventura de Relâmpago Mc Queen e seu amigo atrapalhado Mate. A história criada pelos diretores John Lesseter e Brad Lewis em parceria com o roteirista Dan Fogelman e finalizada por Ben Queen procurou seguir a tendência do mercado de animações e atingir dois públicos distintos ao mesmo tempo, crianças e adultos, mas o resultado final pode não ser plenamente satisfatória a ambas as faixas de público. O roteiro envereda pelo caminho das referências cinematográficas em exagero misturando elementos de filmes sobre espionagem, como das franquias dos agentes Bourne e 007, por exemplo. Além disso, tenta passar o clima acirrado que está por trás dos bastidores das corridas automobilísticas com direito a barracos televisivos e investe em uma trama sobre a guerra existente entre os combustíveis fósseis e os alternativos. Em meio a esses ganchos estranhos ao universo infantil, ironicamente, a trama adota uma postura debochada, forçando a barra com piadas que nem sempre funcionam, principalmente quando são calcadas em referências de planos de espionagem ou calcadas no universo automobilístico, sempre tendo o sotaque caipira de Mate para fazer as vezes do cara sem noção, mas metido a esperto, para quebrar o clima sisudo. Para compensar o enredo estranho, que também volta a tocar de forma tímida no assunto do progresso suplantando o antigo, o humor volta a se fazer presente na transposição de situações do cotidiano dos humanos para o universo automobilístico e, obviamente, no design dos veículos estilizados reproduzindo expressões faciais que ajudam a definir os perfis dos personagens.

O início da animação é bastante tenso e nem parece que estamos acompanhando a continuação da franquia, pois há uma mudança radical de estilo. Uma cena em alto mar, um clima de mistério no ar e uma ótima montagem acompanhada de movimentos de câmera que convidam o espectador a se sentir fazendo parte daquela situação. Com a aprovação quase unânime do original por parte das platéias adultas, pela introdução fica claro que Lasseter queria fisgar mais uma vez esse público oferecendo realmente uma diversão de primeira e explorando novos caminhos. O vídeo de má qualidade que abre a produção é perfeito até em criar falhas propositais, criando assim um prólogo atípico, mas logo a já conhecida Radiator Springs entra em cena, diga-se de passagem, por pouco tempo, mas já não tem o ar convidativo e de novidade de outrora, tanto que logo a ação é desviada para uma grande metrópole, ou melhor, várias. Mas vamos por partes. Quatro anos se passaram desde a primeira visita do ídolo das pistas McQueen à pequena cidadezinha e agora o local voltou a fazer parte do mapa graças ao ilustre e imbatível campeão de quatro Copas Pistão. Todavia, o carrinho esperto e confiante não é o protagonista desta vez. No primeiro filme ele era o herói redimido, mas aqui as atenções são voltadas para Mate, o atrapalhado carro-guincho que se tornou seu amigo fiel. Muita gente criticou tal escolha achando absurda a opção do carro campeão servir de escada para um coadjuvante brilhar, mas é certo que o enferrujado e inocente veículo roubou as atenções em sua primeira aparição. Bem, realmente uma vez que McQueen aprendeu algumas importantes lições de vida, embora ainda mantenha resquícios de arrogância em seu comportamento, não faria muito sentido ele ser novamente o protagonista. Por outro lado, o simpático Mate é dotado de uma personalidade cativante e de fácil identificação, mas a ideia surpreendentemente andou de marcha ré. Ao que tudo indica o público não se sentiu envolvido pelas batidas mensagens de quem ri por último ri melhor e de que seja você mesmo e alcançará o sucesso. McQueen aceita o conselho de Sally, sua grande paixão, e aceita levar Mate junto com ele para uma excursão na qual ele disputará o Grand Prix Mundial patrocinado por Miles Eixoderroda, um magnata dos combustíveis alternativos, mas no fundo sabia que o amigo o atrapalharia. Escalado para colaborar na equipe do atual supercampeão das pistas, o carro-guincho acaba se metendo sem querer em uma rede de intrigas quando é confundido com um espião americano. Aceito no clã dos espiões, Mate demora a compreender que todos por lá pensam que ele usa a personalidade de bobalhão para não deixar pistas. Sentindo-se magoado, a esperança de reconquistar sua autoconfiança bate em seu pára-brisa quando ele descobre o plano de uma espécie de mentor dos automóveis rejeitados, aqueles modelos fora de linha e envelhecidos. O grupo deseja causar um atentado na última corrida do Grand Prix para acabar de uma vez por todas com as chances do Allinol, um combustível experimental, entrar no mercado. Finalmente Mate tem a chance de sentir que fez algo de bom em sua existência atrapalhando os planos da gangue. Apesar dessa banca de herói, os excessos do personagem infantilizam a produção, até porque o roteiro o presenteia com muitas situações embaraçosas.

Procurando ironizar o subgênero dos suspenses de espionagem, contando inclusive com novos personagens como os investigadores Finn McMíssil e Holly Caixadibrita, Lesseter deixa a imaginação rolar solta bolando diversos disfarces e dispondo de dispositivos tecnológicos para que o carro-matuto de sotaque carregado possa brincar a vontade de detetive e ladrão, mas sua principal arma continua sendo sua boca que não pára de disparar piadas e frases irônicas naturalmente, ainda que nesta segunda aventura algumas tentativas de fazer humor soam frustradas como a cena em que Mate invade uma entrevista do amigo disparando que vazou óleo, o equivalente ao fazer xixi nas calças do ser humano. Por outro lado, temos sacadas divertidas como o vaso sanitário eletrônico com instruções em vídeo, mimo encontrado em Tóquio, local da primeira fase da competição automobilística. Aliás, um ponto a favor da produção são as escolhas dos exuberantes cenários. A corrida dos campeões acontece em diversos países e antes da competição é apresentado um vídeo representando uma volta ao mundo valorizando a cultura dos locais em que os carros passarão. As cenas que exibem as paisagens históricas e famosas são muito bonitas e ricas em detalhes, o que dá um toque todo especial à obra. Em termos de visual a Pixar não decepcionou para variar, o que levou a algumas reflexões de que se antes as técnicas de animação eram usadas pelo estúdio como um complemento a ideias originais e com mensagens relativamente complexas, neste caso houve uma inversão, o que reforça os objetivos comerciais da produção visto o grande potencial do material original. Mais uma vez a adaptação de situações corriqueiras para um mundo habitado por automóveis provoca boas risadas, mas existe um excesso de clichês de vários filmes de espionagem desfilando pela tela, sempre acompanhados de um bom toque de humor, já que Mate parece estar sempre no lugar e na hora errados. Enquanto isso, McQueen está viajando disputando corridas contra Francesco Bernoulli, um adversário italiano que tem uma língua bastante afiada, e nem desconfia que não tardará para se tornar alvo da quadrilha dos “tranqueiras”, visto que ele aceitou fazer a última corrida usando o tal do Allinol para provar sua eficácia, uma alternativa que poderia colocar fim na produção de combustíveis a base de petróleo e o sepultamento definitivos dos carros antigos. As duas tramas paralelas protagonizadas pelos então “ex-bons amigos” McQueen e Marte são impregnadas de muita adrenalina e cores e sons vibrantes, o que pode interessar as crianças, mas, como já dito, há muita coisa que pode ser de difícil assimilação dos pequenos, como nomes e situações ligados ao mundo do automobilismo e uma insinuação de bullying. Também deve causar impacto ver, por exemplo, um carro explodindo, algo raro em produções infantis, já que tal ato remete a idéia de morte e violência. É bom deixar claro que a história não é ruim e as situações e piadas já manjadas devem encontrar seus apreciadores, mas por ser uma produção Pixar isso incomoda. Se fosse de outra produtora não existiria talvez essa decepção e seria totalmente aceitável. A capacidade criativa da empresa, no entanto, é bem superior e pesa nas considerações finais de seus produtos. Era costume da Disney lançar as continuações de seus trabalhos diretamente para consumo doméstico e se fosse assim Carros 2 poderia estar a salvo das críticas, mas a ambição falou mais alto entre os executivos dos estúdios. Fazendo uns trocadilhos, este projeto era muito aguardado e o estúdio derrapou na pista. A Pixar soltou o freio de mão, cometeu algumas infrações, mas passou longe de ter sua habilitação invalidada. Colecionou muitas multas e pontos negativos na carteira certamente, por parte da crítica e público, mas os erros serviram para o aprendizado. O tempo passou e o filme não arruinou a imagem da empresa, todavia, fatalmente será considerado um título menor do catálogo da empresa praticamente esquecido entre preciosidades como Toy Story, Monstros S/A, Procurando Nemo... Pensando bem, na linha de chegada entre os filmes da companhia, a segunda aventura de McQueen e Mate deve ficar bem longe das primeiras colocações. O último lugar, infelizmente, é uma realidade nesse ranking.

Animação - 106 min - 2011

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1 – 2 Ruim, uma perda de tempo
3 – 4 Regular, serve para passar o tempo
5 – 6 Bom, cumpre o que promete
7 – 8 Ótimo, tem mais pontos positivos que negativos
9 – 10 Excelente, praticamente perfeito do início ao fim
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