NOTA 2,5 Premissa renderia ao menos uma comédia romântica clichê, mas a a falta de química dos atores e certas situações decepcionam |
Comédia romântica é igual a restaurante
de comida por quilo. Todo mundo sabe que o cardápio é composto por elementos
básicos e repetitivos, mas ainda assim tem sempre alguém a fim de repetir o
prato. O problema é quando o menu servido é um tanto requentado e, pior, com
ingredientes que não combinam. Essa é a sensação que temos ao assistir Hope
Springs – Um Lugar Para Sonhar, produção “solar” que visualmente pode
trazer algo de bom ao espectador, mas se prestar atenção no conteúdo narrativo
a decepção é quase certa. A trama gira em torno de Colin Ware (Colin Firth), um
artista plástico que ficou muito decepcionado quando recebeu o convite de
casamento de sua noiva, a sofisticada Vera (Minnie Driver). Sim, isso mesmo. A
mulher com quem ele se relacionava já a algum tempo estava prestes a se casar
com outro. Para esquecer tal problema e se inspirar para continuar se dedicando
a arte, ele decide sair da Inglaterra e partir rumo aos EUA, mais precisamente
para a pequena cidade de Hope Springs, ou em bom português Fonte da Esperança,
bem sugestivo não? Foi justamente a palavra positiva no nome da cidade que o
atraiu e após muitas horas de viagem ele se hospeda no melhor hotel do local
que é mantido pelo casal Fisher (Frank Collison) e Joanie (Mary Steenburger),
esta que percebendo o estado arrasado do hóspede decide pedir o auxílio de
Mandy (Heather Graham), terapeuta corporal que trabalha no lar de velhinhos da
cidade. Mais que aliviar as tensões do rapaz na base de massagens, a
espirituosa jovem também tem ótimos conselhos a dar e o convence que não
adianta nada ficar preso em um quarto de hotel. É preciso passear, ver
paisagens bonitas, conhecer gente nova e respirar ar puro. Até aí tudo bem,
nada de anormal, mas não tarda para que comecem os tropeços da trama. Mandy
apenas parecia uma moça ajuizada, mas na verdade é beberrona, impulsiva e logo
está dando em cima do artista. É constrangedor ver a personagem se despindo sem
pudor algum diante de um desconhecido e dizendo que sua felicidade só é plena
quando está nua, assim incentivando Ware a fazer o mesmo, obviamente uma
tentativa de levá-lo para cama. Já dá para imaginar que o filme não é lá grande
coisa, mas aos que quiserem se aventurar...
Apesar de resistente no início,
Ware acaba se aproximando de Mandy encantado por seu estilo descontraído e
inocente de ver a vida. Como em toda boa região interiorana, a chegada de um
forasteiro não passa despercebida. Além de todos torcerem pela felicidade do
casal, o artista ganha até a simpatia do prefeito da cidade, Doug Reed (Oliver
Platt), que deseja que ele faça um retrato seu para adornar sua sala de
trabalho. O problema é que Ware faz desenhos a lápis em estilo rascunho, até
deseja fazer uma exposição de rostos do local usando tal técnica, mas o
político deseja seu rosto pintado a óleo tal qual o quadro do fundador da
cidade. Então a busca de Ware pelo aperfeiçoamento de sua arte é o grande mote
desta produção? Antes fosse. Ser um artista plástico é apenas uma desculpa para
justificar a permanência do rapaz em Hope Springs. A grande dúvida do filme é a
velha questão de com quem o protagonista vai ficar. Quando ele está namorando e
feliz da vida com Mandy, é óbvio que Vera reaparece para estragar tudo e
disposta a espalhar algumas verdades e mentiras sobre o ex-namorado. A premissa
básica desta produção não é ruim, simplesmente é batida demais, sem acrescentar
nada de novo ao gênero. Tudo bem para o seu público-alvo que realmente quer
experimentar pela milésima vez o sabor de uma receita conhecida, mas a forma
como o longa é conduzido é extremamente decepcionante. A sequência de créditos
iniciais relativamente extensa e sem um diálogo sequer já denuncia que o filme
não tem muito a dizer. Lá pela metade ficamos sabendo da estapafúrdia verdade
por trás do tal convite de casamento que motiva a viagem de Ware e ainda somos
incitados a nos sentir tocados emocionalmente por ele ter abandonado o pai
doente por conta de uma unha encravada. Parece bizarro demais, mas por incrível
que pareça está no roteiro. É realmente uma pena que um argumento tão simples
que poderia render uma comédia romântica ao menos mediana em comparação a
outras tantas do gênero tenha se transformado em um festival de besteiras que
não diverte e tampouco emociona, somente constrange e aborrece o espectador.
As poucas cenas divertidas são
por conta dos diálogos de Joanie que torce pela felicidade de Ware e Mandy e
deseja ver Vera longe da cidade, temendo inclusive que ocorra um ou mais
assassinatos passionais em seu hotel. Fora essa pitada de humor, todo o resto
soa enfadonho e até vergonhoso. Aliás, é perceptível o constrangimento de
Firth, um ótimo ator, mas que na época ainda não era um nome quente. Embora
tenha no currículo várias comédias românticas, neste caso ele decepciona, mas
também o texto não ajuda colocando-o a discursar frases ridículas. Graham é
escolada no gênero, mas curiosamente praticamente todas as suas moçoilas
românticas têm um quê de maluquinha, característica que chega a incomodar, pois
parece que vive sempre o mesmo papel, a bonitinha com carinha de anjo e
pensamentos endiabrados. Por fim, Driver é talentosa, mas faz péssimas escolhas
e vira e mexe está assumindo papéis que não cativam o público. De qualquer
forma, o trio principal é forte, mas infelizmente não existe liga entre eles,
chegando ao ponto do espectador torcer para que Ware fique sozinho, uma escolha
mais sensata diante de opções que não combinam com seu perfil. Repleto de
problemas narrativos que incomodam bastante é curioso saber que o roteiro e a
direção são de Mark Hermann, profissional que ganhou respeito no meio
cinematográfico com Laura – A Voz de uma
Estrela, elogiado quando lançado, mas infelizmente esquecido. Ele também é
o responsável pelo barulho em torno da adaptação para o cinema de O Menino do Pijama Listrado. Fora isso,
o roteiro é baseado no livro “New Cardiff”, de Charles Webb, autor do romance
que deu origem ao clássico A Primeira
Noite de um Homem. Com tantos nomes gabaritados nos créditos, como Hope
Springs – Um Lugar Para Sonhar pode ser uma decepção? Mesmo com o final
açucarado, até os fãs do gênero devem se sentir insatisfeitos por mais que se
esforcem a tecer elogios. Quando nos lembramos de certos detalhes... A unha
encravada neste caso foi o calcanhar de Aquiles da produção. Desse ponto em
diante tudo é possível.
Comédia romântica - 92 min - 2002
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