terça-feira, 31 de janeiro de 2017

A BELA ADORMECIDA

NOTA 9,0

Um dos maiores clássicos da
Disney quase levou o estúdio
para o limbo devido ao seu alto
custo e fraca repercussão inicial
Em 1959, mais um grande projeto dos estúdios Disney ganhava as telas de cinemas. Considerado até hoje um dos mais ambiciosos longas de animação da companhia e também a mais cara produção do gênero até então, A Bela Adormecida eternizou com muitas cores, humor, romantismo e uma boa dose de suspense o conto de fadas homônimo escrito por Charles Perrault. O texto foi adaptado por Erdman Penner que contou com mais cinco colaboradores que ofereceram sugestões para deixar o resultado final atrativo para as crianças e ao mesmo tempo envolvente para os adultos. Adotando desde o início um visual suntuoso e com aplicações de técnicas de animação avançadas, a obra conta a história de Aurora, uma bela e jovem princesa que foi amaldiçoada logo após seu nascimento pela bruxa Malévola, uma figura medonha que, apesar de não ser mais considerada fada ao trocar o lado do Bem pelo do Mal, se sentiu ofendida por não ter sido convidada para o batizado. A feiticeira então lançou uma maldição sobre a menina: ao completar 16 anos de idade ela perfuraria o dedo no fuso de uma roca e mergulharia em um sono eterno, em outras palavras morreria, uma temática ousada para um desenho animado até hoje. Sorte que a princesinha tinha outro presente para receber de uma fada bondosa e foi agraciada com uma possível solução, mas que dependeria do amor de um homem para funcionar. Somente um beijo de amor verdadeiro salvaria sua vida. A garota cresceu escondida na floresta na casa das fadas Flora, Fauna e Primavera, mas quando o feitiço estava prestes a se quebrar o esconderijo foi descoberto. Graças a uma artimanha de Malévola, o tal presente maligno se concretiza e com Aurora adormecida as fadinhas decidem colocar também todo o reino em um sono profundo até que um rapaz corajoso aparecesse para dar um beijo apaixonado nela. O salvador seria o Príncipe Filipe que já havia conhecido Aurora em um encontro ocasional no bosque, porém, a bruxa também arranja uma maneira de evitar que ele chegue até a bela adormecida, restando a ele contar com sua coragem e os dons das fadas-madrinhas da jovem. Embalada por uma bela trilha sonora inspirada no balé do clássico músico Peter Tchaikovsky, a trama conhecidíssima hoje em dia deu muito trabalho na época para os roteiristas realizarem um script que rendesse cerca de 80 minutos de arte já que a essência do conto original era reduzida a algo em torno de cinco parágrafos excluindo-se as partes supérfluas.

Após investir em contos menos populares na época, como Alice no País das Maravilhas, e em outros originais como A Dama e o Vagabundo, o Sr. Walt Disney resolveu voltar ao mundo dos contos de fadas tomando as devidas precauções para evitar comparações com Branca de Neve e os Sete Anões, já que ambas as histórias possuíam elementos semelhantes. Além da armadilha preparada para a princesa, o sono profundo e a salvação nos lábios de um príncipe, no conto original existiam sete fadas boas para cuidar da jovem. Também foi eliminada a sequência final na qual Aurora já estaria casada e com filhos, além de passagens mais sombrias terem sido cortadas na última versão do roteiro. Os cortes, no entanto, acabaram segregando os conflitos e as ações principais no início e na reta final, assim o recheio do filme é açucarado demais resumindo-se a Aurora, ou Rosa como as fadinhas a rebatizaram para despistar possíveis espiões de Malévola (nomes criados especialmente para o desenho já que no conto ela não recebe nome próprio), cantarolando pelo bosque e conversando com bichinhos. Mesmo com as modificações, estão presentes os elementos básicos de um tradicional conto de fadas, desde a introdução narrada a partir da abertura de um livro até o final feliz apresentado em tom de sonho. A versão Disney para este clássico da literatura infantil é deslumbrante, principalmente porque visualmente a obra envolve o espectador de tal forma que o transporta para a Era Medieval num piscar de olhos. Como não poderia alterar drasticamente a trama, Disney pediu a toda a sua equipe para dedicar atenção especial aos aspectos artísticos e técnicos, não importasse o tempo e o dinheiro que tal requinte consumisse. Sempre atento e a frente do seu tempo, o empresário temia a concorrência da televisão e acreditava que precisava surpreender o público e de quebra ajudar o cinema a demarcar seu território, deixar bem claro que a arte das telonas era bem diferente da consumida gratuitamente na telinha. Para atender as expectativas do chefe, foi necessária quase uma década de trabalho árduo desde os primeiros esboços do roteiro até o lançamento, todavia, o resultado final gerou críticas controversas e resultados financeiros insatisfatórios. O longa consumiu um orçamento exorbitante e só recuperou nas bilheterias metade dessa quantia, ainda que tenha ficado entre os dez filmes mais vistos do ano em solo norte-americano. Dessa forma, o estúdio abandonou as adaptações de contos de princesas nas décadas seguintes coincidindo com o falecimento de Walt Disney, o que certamente desmotivou as equipes de criação.

O rombo financeiro causado por esta produção, que exigiu até empréstimos, deixou o estúdio em maus lençóis, o que influenciou diretamente os projetos lançados entre os anos 60 e 80. A Disney só se reergueu exatamente trinta depois quando voltaram a investir em contos clássicos com A Pequena Sereia. Mais que recuperar-se financeiramente, a empresa voltou a ter prestígio junto a crítica que desprezou o conto de Aurora justamente por condenarem a excessiva preocupação com o requinte artístico em detrimento do desenvolvimento dos personagens. A acusação até tem fundamento. Embora tenham sido usadas referências de pessoas reais previamente gravadas para servirem de inspiração aos animadores, é nítido que Malévola é o personagem mais bem desenvolvido em termos narrativos. Com altivez, frieza e antipatia, cada cena da feiticeira impacta o espectador tamanha a veracidade de suas negativas emoções, algo que se reflete no ambiente em que vive e reforçado pela ideia de que sua única companhia é um corvo de estimação. Curiosamente, a soma de tempo da insossa Aurora em cena é bem inferior a de sua algoz e até mesmo de suas fadas-madrinhas, algumas das personagens mais carismáticas da História da Disney. Justiça seja feita, cada uma delas tem personalidades e características bem definidas e cativam por nos remeterem a ideia de avós ou tias cheias de boas intenções, além de serem as responsáveis por injetar um pouco de humor ao enredo. Príncipe Filipe não aparece tanto, mas sua participação é relevante graças as cenas finais em que a bruxa se transforma em dragão em meio a uma floresta de árvores espinhentas para evitar que o rapaz salve a mocinha indefesa. Um verdadeiro show de animação em tempos em que tudo era feito na ponta do lápis. E era justamente este impacto visual que o Sr. Disney pediu aos diretores Les Clark, Eric Larson e Wolfgang Reitherman que comandaram a equipe de desenhistas focando no visual construindo personagens com traços realistas e ambientes riquíssimos em detalhes baseados em antigas tapeçarias medievais que retratavam o cotidiano do período, o contraste entre a vida dos nobres e dos camponeses. Sucesso ou não no passado, o fato é que A Bela Adormecida conquistou sua posição de destaque na História do cinema, além de recuperar seu investimento com relançamentos nos cinemas e vendas de home vídeo. A cena do famigerado beijo é considerada uma das mais românticas de todos os tempos, encantadora e a síntese literal do amor dos contos de fadas. Muito clichê? Açucarado demais? Inverossímil a história de amor retratada? Infelizmente a inocência de outrora já não existe mais e fora as crianças bem pequenas, somente nostálgicos e quem conseguir pensar na obra em sua época de lançamento poderão atingir e compreender sua beleza de forma integral ou mais próxima de sua importância. 

Animação - 75 min - 1959

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