terça-feira, 20 de dezembro de 2016

A MENINA E O PORQUINHO

NOTA 7,0

Adaptação de clássico literário
infantil pode soar inocente demais
para os novos tempos, mas sua
essência ainda é encantadora
Já faz algum tempo que os adultos estão invadindo a praia das crianças e curtindo desenho animado. Aliás, essas produções às vezes agradam mais aos pais que os próprios filhos ou propositalmente os estúdios já realizam as animações visando essa ampliação espontânea de público. Porém, quando a magia do universo infantil deixa o colorido dos desenhos de lado e é transportada para os filmes com atores de carne e osso o resultado não é o mesmo. Os adultos tendem a não se entreter com piadas batidas, enredo melancólico próprio para dar lições de moral aos pequenos e atuações consideradas fracas, a receita que frequentemente é utilizada neste tipo de produção. Pior ainda quando há bichinhos falantes na trama e os realizadores se concentram tanto em tornar críveis tais criaturinhas que acabam conseguindo um resultado frustrante, pois se esquecem de encontrar um equilíbrio com os demais elementos da produção. Contudo, algumas vezes esses filminhos água-com-açúcar podem ser perfeitamente assistidos e com prazer pelos mais crescidinhos graças ao trunfo da nostalgia que carregam em sua essência. É nesse ponto que A Menina e o Porquinho, protagonizado por Dakota Fanning, consegue um reforço. Esta é mais uma adaptação do clássico livro infantil "A Teia de Charlotte", de E. B. White, que já ganhou uma famosa versão em desenho animado em 1973 que foi repetida a exaustão na TV pelas duas décadas seguintes em todo o mundo. A garotinha que outrora era uma grande promessa de Hollywood interpreta Fern, uma das poucas pessoas a perceber que Wilbur não é um simples porquinho da fazenda onde vive, mas sim um animal muito especial. Com seu carinho e atenção, a garota ajuda o bichinho, que era o menor membro de sua família, a se tornar um porco vistoso e radiante. Quando se muda para um novo celeiro, Wilbur faz amizade com a aranha Charlotte e os laços de amizade entre eles influenciam para que os demais animais da fazenda vivam como se fizessem parte de uma grande e feliz família. Porém, o tempo passa e Wilbur cresce e está a caminho do triste fim de qualquer porquinho criado com tudo de bom e do melhor: virar assado. Quando surge a notícia de que em breve ele será abatido, a esperta e sensível aranha arma um plano para retardar a morte de seu amigo suíno.

Lançada em 1952, a obra original é um sucesso literário indiscutível traduzido para mais de vinte países e com índices de vendagem recordes que não param de crescer visto que constantemente o livro volta ao mercado para arrebatar novas gerações. Os próprios pais incentivam suas crias a conhecerem essa história previsível e clonada das mais diversas formas possíveis, porém, encantadora e emocionante. O citado desenho animado até foi relançado na época de estreia do longa live-action, mas apenas como opção para curiosos e nostálgicos não chegando a ser sucesso. E o filme em si resistirá a ação do tempo? Infelizmente já há evidências que não. Para agradar as novas plateias, o diretor já falecido Gary Winick, o mesmo que cativou crianças e adultos com a comédia De Repente 30, escolheu fazer esta nova versão com atores de verdade e animais adestrados e depois dublados, assim o resultado é bem parecido ou dependendo do ponto de vista idêntico ao agradável Babe - O Porquinho Atrapalhado, o que certamente atrapalhou a carreira do filme. Com uma fazenda como cenário principal, animais fofinhos e falantes e um porquinho simpático e cativante correndo o risco de virar assado, fugir do estigma de cópia é complicado, embora a própria fábula que causou frisson na metade dos anos 90 e vencedora do Oscar de efeitos especiais tenha sido inspirada no livro de White. Contudo, o peso do título e a história conhecida contornam a situação apoiando-se, como já dito, na nostalgia dos que hoje são adultos e se emocionaram com a história de Wilbur em versão animada quando pequenos. Agora é a vez de seus filhos se encantarem com este conto que atravessa gerações passando lições edificantes de amizade e respeito ao próximo. Todavia, esta nova adaptação cinematográfica deveria ter adotado o título original do livro, “A Teia de Charlotte”, visto que é a aranhinha a principal responsável por salvar o porquinho de ser servido na ceia de Natal. Pequena e desacreditada, ela consegue ajudar o amigo tecendo algumas palavras comoventes a seu respeito, o incentivo que não só ele precisava para lutar por sua vida, mas uma necessidade compartilhada por todos os moradores do celeiro, até mesmo pelo rato Templeton que aparentemente surge na história como um vilãozinho. Tais expressões acabam extrapolando as cercas da fazenda e conquistam também os moradores da região que passam a torcer para que Wilbur escape do abate.

A atriz Julia Roberts emprestou sua voz na dublagem original para a aranha Charlotte, a responsável por transformar de maneira positiva a vida todos os animais da fazenda e que foi retratada da forma o mais próxima possível da espécie aracnídea. Os traços grotescos foram respeitados e ajudam a codificar a mensagem de que as aparências enganam, assim passamos a enxergá-la com os olhos bondosos de Wilbur. Bem, essa identificação é possível, no entanto, não se pode negar que é difícil de ser estabelecida. Apesar de todos os esforços em termos de elementos visuais, Winick não consegue transportar totalmente o espectador para o universo do filme, com exceção de crianças bem pequenas que certamente se sentirão atraídas pelas imagens e nem fazem ideia do conteúdo desenvolvido. A trama tem uma duração já acima da média para produções destinadas ao público infantil, mas o ritmo vagaroso parece que duplica esse tempo, sensação intensificada para aqueles que implicam com enredos clichês. Parece que a cada nova cena já se antevê o que vai acontecer, sendo possível prever até o conteúdo dos diálogos. Todavia, a grande falha é que a interação entre o bichinho e a garota do título tem efeito praticamente nulo. Fanning tem lá sua importância na história, mas sua participação é pequena, ficando a sensação de que seu nome foi usado apenas para fins comerciais, atrair público. Qualquer menina com rostinho meigo e um mínimo de desenvoltura e simpatia poderia interpretar Fern que após os minutos iniciais só volta a ser requisitada com mais força na reta final quando sua família resolve prolongar a vida do leitãozinho encontrando uma nova forma de lucrar com ele sem precisar sacrificá-lo. O longa também peca por não ter nenhum momento de clímax, aquela sequência de tensão que nos faz torcer para o protagonista, mesmo sabendo que seu happy end está garantido. A vibração que falta na narrativa obviamente é dada na trilha sonora que soará retumbante na conclusão para tentar arrancar algum arrepio de emoção de quem assiste. Muito recomendável para as crianças pequenas, A Menina e o Porquinho talvez não agrade as mais grandinhas que podem considerar uma obra bobinha. Que vão dizer então os pais hoje tão ligados em adrenalina e piadinhas sarcásticas quanto seus pimpolhos? De qualquer forma, vale a pena dar um voto de confiança à história clássica readaptada por Susannah Grant e Karey Kirkpatrick. Com experiência no universo infantil (colaboraram no roteiro respectivamente de A Fuga das Galinhas e Os Sem-Floresta), a dupla tentou ser tão fiel a inocência da trama original que a fazenda onde Wilbur vive parece um pedacinho do paraíso protegido por uma redoma de vidro. Em meio a tantas produções recheadas de efeitos especiais gritantes e corre-corre que não levam o espectador a lugar algum, ver uma obra infantil com ares de bucolismo e elevando valores morais é um respiro muito bem vindo.

Drama - 97 min - 2006 

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