quarta-feira, 5 de maio de 2021

O CLÃ DAS ADAGAS VOADORAS


Nota 8 Épico chinês é um espetáculo visual que une drama, romance e artes marciais como poucos


Os filmes épicos orientais são verdadeiros colírios para os olhos com seus coloridos vibrantes e cenas de artes marciais cuidadosamente coreografadas e fotografadas, contudo, mais do que belas visualmente, tais produções tendem a ter enredos poéticos e emocionantes que exaltam valores como o amor e a honra. O Clã das Adagas Voadoras é um título que não foge a regra. O diretor Zhang Yimou tem verdadeira paixão por obras que aliam a História da China dos tempos imperiais com combates meticulosamente coreografados e pensados como se cada fotograma fosse tão belo quanto uma pintura. Depois do sucesso de seu longa anterior, o épico Herói, no qual o cineasta investiu pesado em sequências de luta, em seu projeto seguinte ele encontrou formas mais sutis de mostrar golpes e chutes começando muito bem com uma belíssima introdução mostrando a protagonista Mei vivida por Zhang Ziyi em um balé de sons, cores e tecidos esvoaçantes que impressionam pela beleza plástica das imagens combinadas a perfeitos efeitos sonoros. Só vendo para crer e com a certeza de que depois deste início dificilmente alguém não ficará com os olhos grudados na tela até subirem os créditos finais. 

A trama se passa no ano de 859 quando a China passava por terríveis conflitos durante a dinastia Tang, antes próspera, mas decadente no momento. Corrupto, o governo é incapaz de lutar contra os grupos rebeldes que surgem, sendo o mais poderoso e prestigiado deles o chamado Clã das Adagas Voadoras. Leo (Andy Lau) e Jin (Takeshi Kaneshiro), dois soldados do exército oficial, recebem a missão de capturar o misterioso líder dos punhais voadores e para tanto elaboram um plano. Jin se disfarça como um combatente solitário e ganha a confiança da bela deficiente visual Mei, a nova funcionária de uma casa de prostituição e que desconfiam que faça parte do tal grupo de rebeldes. Com a ajuda da moça, os dois corajosos combatentes conseguem se infiltrar no grupo revolucionário, mas a dupla não contava com a paixão que a garota despertaria neles. São várias as reviravoltas do roteiro até que o clímax é atingido quando o passado do clã vem a tona e seus segredos são revelados. Com um tom romântico guiando os caminhos, o enredo criado pelo próprio diretor, em parceria com Feng Li e Bin Wang, privilegia a figura de Mei que inicialmente mostra-se frágil e retraída, mas lá pela metade do filme revela-se uma mulher decidida e muito valente. 


Zhang Ziyi é a responsável pelas cenas mais emocionantes e aparece muito natural no papel, conquistando rapidamente os espectadores confirmando seu talento para produções dramáticas e empenho para complicadas coreografias de lutas marciais, sobressaindo até mesmo em comparação aos seus companheiros de cena que apesar de atuarem com vigor não chegam ao mesmo patamar que a protagonista. Claro que as sequências de luta ganham toques muito especiais graças aos caprichados figurinos, direção de arte e locações que são de encher os olhos, como na cena de batalha em uma floresta de bambu que por pouco não chega a passar a sensação de frescor daquele ambiente a quem está assistindo. Porém, os cenários em que predominam a cor verde estão longe de serem bucólicos. São nesses locais que os protagonistas correm perigo. Vale destacar o efeito especial usado nas sequências em que as adagas ou facas são jogadas contra os inimigos. O movimento da câmera acompanhando esses objetos reproduz a ótica do espectador que então se sente como um personagem onipresente. Quem espera ver cenas de ação e luta no estilo das produções estreladas por Jackie Chan deve se frustrar. Apesar de bons momentos mais agitados, o enredo é bem mais puxado para o lado sentimental e lírico e se aprofunda na criação da história e das personalidades e conflitos dos personagens, o que é muito benéfico para criar um elo com o espectador.

Diferentemente de tantos outros filmes do gênero, aqui os tipos criados são totalmente verossímeis e conseguem expor com muita eficiência os seus sentimentos. Se você já se desanimou por causa disso, não perca as esperanças. Chinesinhos voando para cá e para lá e distribuindo golpes fisicamente impossíveis estão garantidos. Yimou parece não querer abrir mão do aspecto fantasioso em seu trabalho e tem consciência de que é no absurdo que ele encontra espaço para criar verdadeiros espetáculos visuais. Belíssimo da primeira até a última cena, O Clã das Adagas Voadoras é mais uma prova de que o cinema oriental tem qualidades relevantes unindo emoção e espetáculo em um mesmo produto. Ainda tem gente que tem um pé atrás com filmes fora do circuito norte-americano, mas até este enredo se for bem analisado não tem nada de quebra-cabeças. No fundo é mais uma bela história de amor contada de uma maneira diferenciada, mas ainda mantendo aspectos tradicionais. Dois homens dispostos a tudo para conquistarem o amor de uma bela dama é a espinha dorsal desta obra que apesar de ser muito elogiada e indicada a diversos prêmios encontrou resistência para ser exibida nos EUA. 


A exibição só ocorreu graças aos esforços do cultuado cineasta Quentin Tarantino, fã confesso do estilo e que ajudou a levar esta obra de arte para os ianques. O Oscar para variar ignorou um trabalho verdadeiramente artístico para atender aos apelos comerciais, assim indicando o filme apenas para a categoria de fotografia. Era grande a expectativa pela indicação a filme estrangeiro e em várias categorias técnicas que, diga-se de passagem, deixaria seus concorrentes praticamente sem chances de levar a tão cobiçada estatueta dourada para casa. Infelizmente, na temporada de premiações o conceito de cinema como arte é frequentemente esquecido e os aspectos comerciais tem muito mais peso. Se você nunca assistiu a esta deliciosa viagem onírica que Yimou proporcionou ao mundo não sabe o que está perdendo, mas nunca é tarde para correr atrás do tempo perdido.

Drama - 119 min - 2003 

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